segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

No país das Maravilhas...


Conselho de uma lagarta

A Lagarta e Alice olharam-se uma para outra por algum tempo em silêncio: por fim, a Lagarta tirou o narguilé da boca, e dirigiu-se à menina com uma voz lânguida, sonolenta.
“Quem é você?”, perguntou a Lagarta.
Não era uma maneira encorajadora de iniciar uma conversa. Alice retrucou, bastante timidamente: “Eu — eu não sei muito bem, Senhora, no presente momento — pelo menos eu sei quem eu era quando levantei esta manhã, mas acho que tenho mudado muitas vezes desde então.
“O que você quer dizer com isso?”, perguntou a Lagarta severamente. “Explique-se!”
“Eu não posso explicar-me, eu receio, Senhora”, respondeu Alice, “porque eu não sou eu mesma, vê?”
“Eu não vejo”, retomou a Lagarta.
“Eu receio que não posso colocar isso mais claramente”, Alice replicou bem polidamente, “porque eu mesma não consigo entender, para começo de conversa, e ter tantos tamanhos diferentes em um dia é muito confuso.”
“Não é”, discordou a Lagarta.
“Bem, talvez você não ache isso ainda”, Alice afirmou, “mas quando você transformar-se em uma crisálida — você irá algum dia, sabe — e então depois disso em uma borboleta, eu acredito que você irá sentir-se um pouco estranha, não irá?”
“Nem um pouco”, disse a Lagarta.
“Bem, talvez seus sentimentos possam ser diferentes”, finalizou Alice, “tudo o que eu sei é: é muito estranho para mim.”
“Você!”, disse a Lagarta desdenhosamente. “Quem é você?”
O que as trouxe novamente para o início da conversação. Alice sentia-se um pouco irritada com a Lagarta fazendo tão pequenas observações e, empertigando-se, disse bem gravemente: “Eu acho que você deveria me dizer quem você é primeiro.”
“Por quê?”, perguntou a Lagarta.
Aqui estava outra questão enigmática, e, como Alice não conseguia pensar nenhuma boa razão, e a Lagarta parecia estar muito chateada, a menina despediu-se.
“Volte”, a Lagarta chamou por ela. “Eu tenho algo importante para dizer!”
Isso soava promissor, certamente. Alice virou-se e voltou.
“Mantenha a calma”, disse a Lagarta.
“Isso é tudo?”, retrucou Alice,engolindo sua raiva o quanto pôde.
“Não”, respondeu a Lagarta.
Alice pensou que poderia muito bem esperar, já que não tinha nada para fazer, e talvez no fim das contas ela poderia dizer algo que valesse a pena. Por alguns minutos a Lagarta soltou baforadas do seu cachimbo sem falar; afinal, ela descruzou os braços, tirou o narguilé da boca novamente e disse:
“Então você acha que mudou, não é?”
“Temo que sim, Senhora”, respondeu Alice. “Não consigo lembrar das coisas como antes — e não mantenho o mesmo tamanho nem por dez minutos!”
“Não consegue lembrar que coisas?”, continuou a Lagarta.

(...)

A Lagarta foi a primeira a falar.
“De que tamanho você quer ser?”, ela perguntou.
“Oh, eu não ligo para qual tamanho”, respondeu Alice apressadamente, “apenas um que não fique mudando sempre, a senhora sabe.”
“Eu não sei”, retrucou a Lagarta.
Alice não disse mais nada: ela nunca fora tão contradita em toda sua vida antes e sentia que estava perdendo a paciência.
“Você está satisfeita agora?”, indagou a Lagarta.
“Bem, eu gostaria de ser um pouco maior, Senhora, se não se importar”, disse Alice, “oito centímetros é um tamanhozinho meio pequeno demais.”
“É um ótimo tamanho certamente!”, vociferou a Lagarta, levantando-se enquanto falava (ela tinha exatamente oito centímetros de altura).
“Mas eu não estou acostumada com isso!”, alegou a pobre Alice em um tom consternado.
“Você se acostumará com o tempo”, retrucou a Lagarta, e colocou o narguilé na boca, começando a fumar novamente.
Desta vez Alice esperou pacientemente até a Lagarta querer falar novamente. Depois de um ou dois minutos a Lagarta tirou o cachimbo da boca, e bocejou uma ou duas vezes e espreguiçou-se. Então desceu do cogumelo e arrastou-se para longe, simplesmente observando, ao sair: “Um lado irá fazê-la crescer e o outro irá fazê-la diminuir.”
“Um lado do quê? Outro lado do quê?”, pensava Alice consigo mesma.
“Do cogumelo”, respondeu a Lagarta, como se Alice tivesse falado alto, e já no momento seguinte ela estava fora da vista.
Alice permaneceu olhando pensativamente para o cogumelo por um minuto, tentando compreender quais eram os dois lados da planta, e, como ela era perfeitamente redonda, sentiu-se em meio a uma difícil questão. Entretanto, afinal a menina esticou seus braços o mais que pôde em torno do cogumelo e cortou um pedaço da borda com cada mão.
“E agora, qual é qual?” disse Alice para si mesma, mordiscando um pouco da mão direita para sentir o efeito. No momento seguinte ela sentiu um violento golpe debaixo do queixo: ela batera no seu pé.
Ela estava muito assustada com esta súbita mudança, mas sentiu que não havia tempo a perder, pois estava encolhendo rapidamente. Alice colocou mãos à obra para comer do outro pedaço. Seu queixo estava tão fortemente pressionado contra seu pé, que não havia espaço para abrir a boca; mas ela conseguiu afinal, e esforçou-se para engolir um bocado da mão esquerda.

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